Jogos facilitam o aprendizado do aluno e permitem que o professor acompanhe as dificuldades com determinado conteúdo
A pilha com bolas de sorvete cresce a cada resposta correta
sobre a tabuada, premiando quem consegue a de maior tamanho. Resolver
equações de primeiro grau torna-se condição para a formação dos átomos
que farão parte dos experimentos de um cientista. As duas propostas são
exemplos de jogos que aliam o aprendizado de matemática à diversão e
fazem parte do Programa Sesi Matemática, que beneficiará as escolas
estaduais do Rio de Janeiro.
Até agora, apenas uma das 11 escolas previstas na primeira fase de
implantação do programa recebeu o kit com os jogos. Mas já é possível
perceber o impacto nos estudantes. Em setembro, foi inaugurada uma sala
especial no Colégio Estadual Compositor Luiz Carlos da Vila, em
Manguinhos. Duas turmas do primeiro ano do ensino médio participam do
projeto. "A gente nota uma diferença muito grande. Eles estão gostando
muito, ficam mais tranquilos, mais concentrados", avalia a
diretora-adjunta da escola, Elaine Gayoso. Segundo ela, a experiência
tem dado tão certo que professores de outras turmas estão procurando
horários para levarem seus alunos ao laboratório.
Em contraste aos objetos impressos no livro didático, a interação
proporcionada pelo ambiente virtual facilita a assimilação do conteúdo,
analisa o professor-adjunto da Faculdade de Educação da Universidade de
Brasília (UnB) Cristiano Alberto Muniz. "A criança consegue trabalhar
com uma representação dos objetos matemáticos de forma mais dinâmica",
explica. A criação de um espaço de experimentação, onde é possível
acertar e errar sem que haja a sensação de punição muitas vezes imposta
pela marca da borracha no papel, também é importante, na visão do
professor. "Nesse espaço virtual, ela pode apagar, voltar, e isso é
fundamental", justifica.
A riqueza da experiência, tanto para alunos quanto para professores,
também conta como ponto a favor, opina Muniz, que também é presidente da
Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM). Ele acrescenta que
uma atividade lúdica como essa torna o aprendizado mais espontâneo, já
que a criança deixa de lado a preocupação excessiva em dar uma resposta
ao que ele chama de contrato didático. "Em vez de fazer a construção
daquilo que o professor espera dele, no jogo ele está mais preocupado em
atingir o objetivo da atividade lúdica", entende. Para os docentes, o
estímulo à criatividade é a principal vantagem. "O livro pré-estabelece
determinados procedimentos e resolução de problemas, enquanto que no
ambiente virtual ele é desafiado a construir situações", observa Muniz.
Os jogos ainda permitem ao professor detectar se o aluno tem
dificuldade em determinado conteúdo. A gerente de educação básica do
Sesi-RJ, Hozana Cavalcante Meirelles, explica que o próprio programa
exibe dicas e informações, ou indica o assunto que deveria ser aprendido
antes de o aluno participar daquele jogo. Além disso, o educador tem à
disposição um sistema de avaliação que lhe permite monitorar as questões
feitas e o tempo que o aluno levou para respondê-las. A partir do
relatório gerado ao final de cada desafio, o professor pode propor
trabalhos individuais ou outro tipo de atividade de acordo com a
necessidade percebida.
Objetivo é difundir programa em escolas do RJ até 2015
Em 2011, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro
(Firjan), por meio do Sesi-RJ, firmou uma parceria com a desenvolvedora
inglesa de jogos matemáticos Manga High. Para a criação dos games, uma
equipe no Brasil analisou o currículo instituído pelo Ministério da
Educação (MEC) e adaptou ao formato. O conteúdo, segundo Hozana, foi
agrupado de acordo com o nível de aprendizado previsto para cada série
do ensino fundamental e médio, em colaboração com o Instituto Nacional
de Matemática Pura e Aplicada (Impa). São diversos jogos, alguns com
mais de cem fases diferentes, totalizando mais de 50 mil desafios.
A infraestrutura conta com 40 laptops, lousa digital, projetor, TV de
42 polegadas, quadro branco, mesas em grupos e kit com materiais
concretos, como esquadros gigantes, objetos geométricos e brinquedos.
Não há previsão para que as outras 10 salas de matemática sejam
entregues nas escolas estaduais do Rio de Janeiro e região metropolitana
listadas pela Secretaria Estadual de Educação (Seeduc). Para o ano que
vem, o plano é expandir o programa para mais 287 escolas - 26 delas com a
implantação da sala. Até 2015, a previsão é de que R$ 60 milhões sejam
investidos para a cobertura integral das instituições estaduais de
ensino no Rio de Janeiro, sendo 10% delas beneficiadas com a construção
da sala.
Para garantir o aproveitamento em sala de aula, os professores
passaram por um período de capacitação. Mas o programa também pode ser
acessado de fora da escola. Com a opção online, os alunos podem treinar
suas habilidades matemáticas a partir de qualquer computador, além de
competir com alunos do mundo inteiro.
Software gratuito já é usado em quatro Estados
Os jogos que serão oferecidos nas escolas estaduais do Rio de
Janeiro seguem a linha de alternativas já existentes para o ensino da
matemática com ferramentas digitais. Uma delas é o GeoGebra, um software
de matemática dinâmica gratuito e compatível com diferentes
plataformas. Criado em 2001 pelo austríaco Markus Hohenwarter, o
programa combina conteúdos de geometria, álgebra, tabelas, gráficos,
estatística e cálculo. No Brasil, quatro institutos difundem a
aplicação, no Rio de Janeiro (RJ), em São Paulo (SP), em Maringá (PR) e
em Fortaleza (CE).
A coordenadora do Instituto GeoGebra São Paulo, Celina Abar, explica
que o software pode ser utilizado a partir do momento em que a
matemática começa a ser ensinada, inclusive em turmas de alunos mais
novos. Para ela, a utilização depende da atitude positiva do docente em
relação à ferramenta, bem como do apoio dos órgãos educacionais. O
instituto paulista foi o terceiro criado na América Latina e está
vinculado à Faculdade de Ciências Exatas e Tecnologia da PUC-SP. Segundo
a coordenadora, uma das áreas de pesquisa desenvolvidas recentemente
tem se voltado para a adaptação do GeoGebra em tablets.
Em Santa Catarina, a professora de matemática Ana Lúcia Pintro é uma
das adeptas do uso do GeoGebra em sala de aula. Há quatro anos, ela
emprega a ferramenta em turmas do 6º ao 9º ano do ensino fundamental em
duas escolas municipais: a EMEF Padre José Francisco Bertero, em
Criciúma, e a EEF Demétrio Bettiol, em Cocal do Sul. A experiência tem
sido gratificante. "Eles assimilam os conceitos fundamentais sem ser uma
coisa forçada. É como aprender a falar, a comer", compara a professora.
Sem curso preparatório - Ana Lúcia garante ter aprendido a utilizar o
GeoGebra lendo os manuais disponibilizados na internet -, a educadora
já elaborou uma lista com mais de 50 jogos e atividades que podem ser
explorados com o uso do software. A professora também disponibiliza em
seu blog algumas apostilas com essas tarefas para professores que
queiram fazer uma experiência com o programa em suas aulas.
Mesmo com a disponibilidade de programas gratuitos para o ensino da
matemática, Celina acredita que as escolas brasileiras têm de passar por
uma adequação. "Os professores têm que se adaptar. As crianças já
nascem com o dedo na tela", afirma. A coordenadora do Instituto GeoGebra
São Paulo também aposta na falta de formação própria para esse fim como
uma das causas para a baixa adesão em comparação a outros lugares do
mundo. "É um trabalho lento", admite. Para o professor Cristiano Alberto
Muniz, a estrutura deficiente também é um fator condicionante. "Nós não
disponibilizamos tecnologia para explorar toda essa riqueza", lamenta.
O presidente da SBEM indica ainda a falta de uma cultura pedagógica
que encare as novidades tecnológicas como aliados da educação - segundo
ele, a maioria dos professores atuais pertence a uma geração que não
teve contato direto com as inovações da área. Além disso, ele afirma que
a carência de investimentos também é prejudicial. "O estado tem que
investir na alfabetização tecnológica dos professores, ou eles não vão
conseguir se apoderar dessas tecnologias como instrumento pedagógico",
sentencia.
Pesquisa realizada no site:
http://noticias.terra.com.br